Todos os homens são “filósofos”
Introdução

Todos os homens são
“filósofos”
Antonio Gramsci, um filósofo italiano do século
passado, já alertava para a necessidade de se combater o preconceito muito
difundido de que a Filosofia é uma atividade intelectual muito difícil e, por
isso, restrita a uma minoria
de inteligência supostamente privilegiada. Isso porque, para ele, em um certo
sentido, “todos os homens são
‘filósofos’”, pois, de algum modo, todas as pessoas, sem distinção,
independentemente de seu grau de escolaridade, lidam, convivem, trabalham com a
Filosofia e a utilizam no seu dia a dia, mesmo que não se apercebam disso.
Afinal, a Filosofia está presente “na linguagem,
no senso comum, no bom senso, na religião”, enfim, “em todo sistema de crenças, superstições,
opiniões, modos de ser e agir” que caracteriza o que somos.
A linguagem

O senso comum é o conjunto de valores, crenças, opiniões,
preferências, que constitui a nossa visão de mundo e que orienta nossas ações e
escolhas cotidianas. Em geral é assimilado acriticamente, sem qualquer
questionamento. A exemplo do que acontece com a linguagem, muitos desses
valores e crenças têm origem na Filosofia, mas nós os assimilamos
espontaneamente, sem nos darmos conta de sua origem. Simplesmente pensamos e
vivemos de uma determinada maneira, acreditamos em certo grupo de valores,
defendemos alguma posição política, ideológica ou religiosa, e assim por
diante, sem, no entanto, nos preocuparmos em fundamentar nossas opiniões. Ao
contrário, contentamo-nos com argumentos superficiais, muitas vezes até
inconsistentes ou contraditórios.
O bom senso
O “bom senso”, por sua vez, “coincide com a Filosofia”. Enquanto o
senso comum é acrítico, espontâneo, irrefletido, o bom senso implica refletir,
tomar consciência de que os acontecimentos possuem uma dimensão racional e que,
portanto, devem ser compreendidos e enfrentados também de forma racional, a fim
de se obter uma orientação consciente para a ação, evitando se deixar levar por
“impulsos instintivos e violentos”. Esse “bom senso” é o que Gramsci chamou de
“núcleo sadio do senso comum”. Ou seja, mesmo no nível do senso comum é
possível refletir, pensar de maneira crítica sobre a realidade, tomar
consciência dela e agir de modo coerente com essa consciência. E isso, de certo
modo, já é “filosofar”, pelo menos um filosofar ao nível do senso comum. De
fato, não é raro vermos pessoas simples, às vezes com pouca ou nenhuma
escolaridade, que revelam um entendimento aguçado e bem elaborado da realidade
em que vivem.
A religião

Portanto, se a Filosofia está contida na linguagem, no senso comum, no bom senso
e na religião, podemos dizer então que ela está
presente em todas as dimensões da vida humana, sendo, portanto, familiar a
todas as pessoas. Afinal, toda atividade humana, mesmo aquelas que são
predominantemente práticas (as diversas formas de trabalho manual, por
exemplo), é sempre acompanhada de um pensar, de um saber, em suma, de um
trabalho intelectual, racional, reflexivo. É
nesse sentido que podemos afirmar que “todos os homens são ‘filósofos’”.
Filósofos e “filósofos”
Se “todos os homens são ‘filósofos’”, como quer
Gramsci, qual é, então, a diferença
entre o filosofar de uma pessoa comum e o de um filósofo profissional ou
especialista? O próprio autor esclarece: “O filósofo profissional ou
técnico não só ‘pensa’ com maior rigor lógico, com maior coerência, com maior
espírito de sistema do que os outros homens, mas conhece toda a história do
pensamento, isto é, sabe as razões do desenvolvimento que o pensamento sofreu
até ele e está em condições de retomar os problemas a partir do ponto em que
eles se encontram após terem sofrido a mais alta tentativa de solução etc. Ele
tem, no campo do pensamento, a mesma função que nos diversos campos científicos
têm os especialistas”. Em outras palavras, podemos dizer que o filósofo especialista: pensa, reflete,
raciocina observando mais cuidadosamente as regras da lógica e os procedimentos
metodológicos que utiliza; conhece a história do pensamento, isto é, a história
da Filosofia; é capaz de analisar os problemas de seu tempo à luz da
contribuição dos filósofos do passado que já se debruçaram sobre eles.
Mas se existe essa diferença entre o filósofo
especialista e o não especialista, por que então afirmar que “todos os homens
são ‘filósofos’”? Justamente para combater e destruir aquele preconceito de que
a Filosofia é uma atividade muito difícil e restrita a uma minoria. É importante perceber que a propagação
desse preconceito cumpre uma função política conservadora, na medida em que
afasta a Filosofia do contato com as massas, com o povo, com as pessoas mais
simples. Dessa forma, impedidas de se apropriar dos conceitos e das teorias
elaboradas pelos filósofos, as pessoas ficam desprovidas dessas ferramentas
intelectuais que lhes permitiriam superar mais facilmente o senso comum e
adquirir um conhecimento mais crítico e elaborado da realidade em que vivem.
Além disso, cabe afirmar que todos os homens
são “filósofos” para deixar claro que todas as pessoas são potencialmente
capazes de avançar de um “filosofar” espontâneo, assistemático, restrito ao bom
senso, para um filosofar mais elaborado e rigoroso, semelhante ao praticado
pelos filósofos especialistas.
Atividade para
reflexão:
1-Qual é solução encontrada pelo pensador Antonio Gramsci,
para superar a visão preconceituosa existente sobre a filosofia e o ato de
filosofar?
2- Por que Gramsci
afirma que: “todos os homens são “filósofos”?
3- Diferencie o filósofo especialista do filósofo não
especialista.
4- Diferencie Senso comum de bom senso.
5- Em quais áreas podemos encontrar a presença da filosofia em
nosso cotidiano. Justifique sua resposta.
Referências bibliográficas:
GRAMSCI,
A. Caderno 11 (1932-1933). Introdução ao estudo da Filosofia. In: Cadernos do
cárcere. Vol.1. Edição Carlos Nelson Coutinho com Marco Aurélio Nogueira e Luiz
Sérgio Henriques. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2001. p. 410.
MATERIAL
DE APOIO AO CURRÍCULO DO ESTADO DE SÃO PAULO CADERNO DO PROFESSOR FILOSOFIA
ENSINO MÉDIO 3ª SÉRIE VOLUME 1. Texto Elaborado especialmente para o São Paulo
faz escola.
Nenhum comentário:
Postar um comentário